Uma tragédia ecológica

CB, Cidades, p. 27 - 20/09/2005
Uma tragédia ecológica
Incêndio com labaredas de até dez metros de altura já havia destruído, no início da noite de ontem, 40% da vegetação do Jardim Botânico e metade da Reserva do IBGE

Leandro Bisa
Da equipe do Correio

No dia mais quente do ano, o paraíso se transformou em inferno. Duas das principais reservas ecológicas do Distrito Federal, uma ao lado da outra, arderam em chamas ontem. No início da noite, labaredas de até dez metros de altura já haviam devastado 40% do Jardim Botânico de Brasília (JBB) e metade da Reserva Ecológica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (Reserva do IBGE). O fogo havia consumido cerca de 2,5 mil hectares - área equivalente ao tamanho de três mil campos de futebol - mas ainda estava longe de ser controlado. É o maior incêndio do ano no DF, segundo dados do Batalhão de Incêndios Florestais (BFI) do Corpo de Bombeiros.
Os militares acreditam que o fogo começou por volta das 10h, no JBB, e, logo em seguida, passou para a Reserva do IBGE. Às 16h, o comandante da operação de combate ao incêndio, capitão Carlos Antônio dos Santos, entrou no helicóptero do Corpo de Bombeiros para sobrevoar a área queimada. Após 20 minutos, de volta ao solo, disse: "Deve ser o maior incêndio do ano. A linha de fogo tem aproximadamente 15 quilômetros de extensão e avança em duas direções". A confirmação de que a queimada era a maior de 2005 viria em uma hora.
A Reserva Ecológica do IBGE tem 1,4 mil hectares, mas a parte de mata mais atingida está do lado do JBB, segundo o capitão. "Cerca de 70% do incêndio está no lado do Jardim Botânico (que tem 5 mil hectares de área)", disse o oficial. O JBB passou três meses fechados para reformas na área destinada à visitação. O parque seria reaberto ao público na próxima sexta-feira, mas, diante da tragédia, o secretário de Parques e Unidades de Conservação (Comparques) do DF, Ênio Dutra, pode mudar de idéia. "Vamos decidir isso depois da avaliar o estrago. A previsão é que o fogo só seja controlado por volta das 4h ou 5h da madrugada (de hoje) e que, ao final, 50% do parque, ou mais, tenha sido queimado", comentou Dutra.
Ontem, a situação era tão crítica que apenas dois militares ficaram no quartel do BFI. Todos os demais, com apoio do Batalhão de Buscas e Salvamento (BBS), lutaram contra o fogo. Eram 110 bombeiros no total. Eles contaram com apoio de 60 funcionários do JBB e da Reserva Ecológica do IBGE. Capitão Santos afirmou que, só após o incêndio ser controlado, é que se poderá descobrir a causa do fogo e a área total queimada.
Segundo o oficial, o tempo seco e a alta temperatura contribuíram para que o fogo se espalhasse rapidamente. No auge do incêndio, às 16h, os termômetros do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) registravam a mais alta temperatura do DF neste ano: 32,7 oC. A umidade chegou a 24%. "Além disso, a área oferece combustível em abundância para o fogo", explicou o comandante.
Os bombeiros tiveram muita dificuldade em combater o incêndio por terra, em razão das altas chamas. Os soldados não podiam usar abafadores contra as labaredas, pois o risco de serem atingido pelas chamas ou cercados pelo fogo era grande. O Grupamento Aéreo precisou ser acionado. A aeronave jogava água no incêndio para diminuir a intensidade das labaredas. Logo que o mato era molhado, os militares em terra se apressavam em usar os abafadores.
O problema é que o helicóptero tem capacidade para transportar apenas 540 litros de água em cada viagem. "Em certos locais do incêndio, é como cuspir em uma fogueira", lamentou o subcomandante do BBS e co-piloto, major André Luiz Diniz Rapouso. "Não tem como combater por terra. Está tudo contra a gente. O vento está forte, o dia está muito quente e a o capim está alto", acrescentou o oficial.
Por onde o fogo passou, ficou só destruição. O verde deu lugar à fuligem negra, que tomou conta do chão e do horizonte. Dentro da área atingida, para qualquer lado que se olhasse, era só tristeza e silêncio. Os animais silvestres que habitam as reservas - entre eles, veados, lobo-guarás, cobras e aves raras - desapareceram. Fugiram ou morreram.

Incêndio é o maior do ano
As reservas devastadas ontem estão dentro da Áerea de Proteção Ambiental (APA) Gama-Cabeça de Veado. A região tem sofrido com incêndios em 2005, principalmente na área próxima à Escola de Administração Fazendária (Esaf), onde está o Jardim Botânico de Brasília e a Reserva Ecológica do IBGE. Ali também está a Fazenda Águas Lindas (FAL), da Universidade de Brasília (UnB). Até hoje, o maior incêndio de 2005 havia acontecido na FAL, em 31 de agosto, quando 1,2 mil hectares acabaram em chamas.
Outro grande incêndio registrado neste ano também ocorreu no Jardim Botânico, em 22 de julho: 500 hectares de cerrado viraram brasas em seis horas. Cerca 300 espécies de Aves, 45 de mamíferos, 17 de cobras e 215 de abelhas vivem nas matas do JBB. Algumas das espécies só existem ali. É o caso do peixe pirá-brasília e de uma espécie de camarão de água doce.

CB, 20/09/2005, Cidades, p. 27
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